PRO LETRAMENTO - Aula 8
Conhecer o alfabeto implica, ainda, que o aluno compreenda que as letras variam na forma gráfica e no valor funcional. As variações gráficas seguem padrões estéticos, mas são também controladas pelo valor funcional que as letras têm. As letras desempenham uma determinada função no sistema, que é a de preencher um determinado lugar na escrita das palavras. Portanto,
é preciso conhecer a categorização das letras, tanto no seu aspecto gráfico, quanto no seu aspecto funcional (quais letras devem ser usadas para escrever determinadas palavras e em que ordem). Apesar das diferentes formas gráficas das letras em nosso alfabeto (maiúsculas, minúsculas, imprensa, cursiva), uma letra permanece a mesma porque exerce a mesma função
no sistema de escrita, ou seja, é sempre usada da maneira exigida pela ortografia das palavras.
Dizendo de outra maneira: mesmo variando graficamente, as letras têm valores funcionais fixados pela história do alfabeto e, principalmente, pela organização das palavras em cada língua.
Uma das implicações do princípio de identidade funcional das letras para o processo de alfabetização é que o aluno precisa aprender que não pode escrever qualquer letra em qualquer posição numa palavra, porque as letras representam fonemas, os quais aparecem em posições determinadas nas palavras.
É bom ressaltar que conhecer o alfabeto representa desenvolver capacidades específicas, conforme se trate de ler ou de escrever. Para ler, é indispensável a capacidade perceptiva que possibilita identificar cada letra, distinguindo umas das outras. Para escrever, além da acuidade perceptiva, é necessária a capacidade motora de saber grafar devidamente cada letra.
Embora a unidade foco do alfabeto seja a letra, podem ser propostas atividades em que as letras sejam situadas em sílabas, em palavras e em textos. Por exemplo, diante de textos lidos – mesmo que pelo professor ou pela professora – os alunos podem se deter no reconhecimento das letras e de sua posição, distribuição e função nas palavras. Do mesmo modo, na tentativa de escrever – mesmo que textos simples como etiquetas, crachás, listas – os alunos poderão operar direta e produtivamente com diferentes tipos e funções das letras. Essa sugestão mostra uma das maneiras de trabalhar simultaneamente um conhecimento específico do domínio do código
escrito com conhecimentos relacionados à inserção no mundo letrado (isto é, conhecimentos que incrementam o grau de letramento do aluno), como o emprego útil da escrita em textos que fazem sentido para as crianças.
(ii) Conhecer e utilizar diferentes tipos de letra (de fôrma e cursiva)
Alguns estudos recomendam o uso exclusivo de letras de fôrma maiúsculas nos primeiros momentos da alfabetização, pelo menos até que o aluno passe a reconhecer todas as letras e tenha destreza na escrita das palavras. Essa orientação apóia-se em alguns pontos. No âmbito da leitura, um argumento é que, por serem unidades separadas (e não contínuas ou “emendadas” como as letras cursivas manuscritas), as maiúsculas de imprensa podem ser
diferenciadas e contadas mais facilmente pelos alunos. Outro argumento é que é mais fácil reconhecer as letras que aparecem em seqüência nas diversas palavras quando essas letras se apresentam com tipos uniformes e regulares, ao invés de mostrarem traços variados (ora maiúsculas, ora minúsculas; ora letra de fôrma ou de imprensa, ora letra cursiva). No âmbito da escrita, o principal argumento é que as letras maiúsculas são mais fáceis de escrever,
especialmente para as crianças pequenas.
Já os defensores do método analítico e/ou global recomendam adotar, no início do processo de alfabetização, a letra de fôrma minúscula e a letra cursiva. A justificativa para essa recomendação é que a memorização do texto, sentença ou palavra, que é a estratégia básica nesse método, apóia-se na imagem ideovisual, ou seja, na silhueta da palavra, e é facilitada pela
configuração gráfica diferenciada das palavras, com letras de traçado ascendente, isto é, para cima, com relação à linha (‘bola”, “tatu”, “farelo”), ou descendente, quer dizer, para baixo, com relação à linha ou pauta (“pipoca”, “gago”, “quase”), ou ascendente e descendente (“galo”, “peteca”, “galope”).
Em sala de aula, essa questão poderá ser encaminhada de maneira
produtiva com flexibilidade e sensibilidade para o aprendizado
específico que estiver em foco a cada momento. Por exemplo, quando
buscar desenvolver a capacidade de leitura autônoma dos alunos, será
mais adequado que o professor ou a professora trabalhe com textos
escritos em letras de fôrma maiúsculas, cuja identificação é mais fácil
para as crianças. No entanto, não é recomendável
que, em nome dessa facilidade, se impeça o contato de seus alunos com
textos e impressos com outros tipos de letras, que circulem socialmente
em diversos suportes, cumprindo diferentes funções.
É também importante que professores e professoras fiquem atentos ao momento mais adequado para apresentarem sistematicamente aos seus alunos as letras minúsculas e as cursivas.
Especificamente quanto às funções da escrita cursiva, é importante o aluno saber que, além de representar estilos individuais de traçar as letras, ela também serve para se escrever com rapidez. Compreendendo os usos da escrita cursiva, os alunos poderão concluir que é possível escrever com a letra que quiserem quando fizerem anotações pessoais, mas que deverão
procurar fazer “letra boa” quando forem escrever para outras pessoas. O desenvolvimento de uma caligrafia legível e com boa apresentação estética, além da organização adequada da escrita nos cadernos, ainda continuam sendo objetivos a serem alcançados pela escola.
Compreender a natureza alfabética do sistema de escrita
Nem todos os sistemas humanos de escrita grafam os “sons” da língua
falada, e entre os que o fazem, nem todos são “alfabéticos”. Há símbolos
da escrita chinesa, por exemplo, que não representam sons, mas idéias,
conceitos. São ideográficos. Na escrita japonesa, há sinais que
representam sílabas.
Nosso sistema de escrita é alfabético. Isso significa que seu princípio
básico é o de que cada “som” é representado por uma “letra” – ou seja,
cada “fonema” por um “grafema”. A história da invenção da escrita e a
existência de diferentes sistemas de escrita mostram que a
correspondência som-letra nem é óbvia e natural, nem é a única possível.
Isso significa, por um lado, que é perfeitamente plausível que algumas
crianças imaginem que a escrita do português seja ideográfica, ou
silábica, por exemplo. E, por outro lado, significa que é necessário
trabalhar essa questão em sala da aula.
Dizendo de outra maneira, um conhecimento fundamental que os alunos
precisam adquirir no seu processo de alfabetização diz respeito à
natureza da relação entre a escrita e a cadeia sonora das palavras que
eles tentam escrever ou ler. Analisando as relações entre a fala e a
escrita,
muitas crianças chegam, por exemplo, a elaborar a hipótese silábica,
acreditando que cada letra representa uma sílaba e não um fonema,
conforme já descreveram os estudos da psicogênese da escrita.
É necessário que o alfabetizador ou a alfabetizadora saiba identificar e
compreender esse tipo de raciocínio feito pelos alunos, para conseguir
orientá-los com sucesso na superação dessa hipótese e na descoberta da
explicação que realmente funciona para o sistema de escrita do
português.
Esse aprendizado, que representa um avanço decisivo no processo de alfabetização, se realiza quando o aluno entende que o princípio geral que regula a escrita é a correspondência “letrasom”, ou, em termos técnicos mais apropriados, grafema-fonema. Isso significa compreender a natureza alfabética do sistema de escrita e se manifesta quando a criança começa a tentar ler e escrever de acordo com o princípio alfabético (uma “letra”, um
“som”).
Por outro lado, é importante também que as práticas pedagógicas levem em conta algumas dificuldades que podem aparecer nos primeiros momentos da
apropriação do sistema alfabético. Nas primeiras tentativas de lidar com as relações entre fonemas e grafemas, alguns alunos poderão tender a
ler, por exemplo, beola, em vez de bola. É possível que esses alunos estejam operando com o seguinte raciocínio: “esta palavra começa com a letra B, que tem o som de [bê], então devo ler be-o-la”. Nesse caso, as crianças estão apenas relacionando o nome da letra ao fonema que ela representa. Pode-se ajudá-las a abandonar essa hipótese equivocada explorando contrastes com
palavras em que o fonema consonantal apareça seguido de diferentes vogais, por exemplo, desafiando-as a ler e escrever bala, bela, bola, bula, ou taco, teco, tico, toco, Tuca, Tuco.
Muitas atividades podem ser (e normalmente são) desenvolvidas em sala de
aula para facilitar aos alunos a indispensável compreensão do princípio
alfabético. Entre elas, aquelas que envolvem a identificação de
determinada relação fonema-grafema em um conjunto de palavras que a
apresentam, como, por exemplo, a identificação do fonema /f/ nas
palavras fita, foto,
futebol, farofa. Outro exemplo é o das atividades que exploram a
contraposição entre palavras parecidas, cuja diferença se deve a um
fonema, representado na escrita por uma letra: cala e cola; janela e
panela; maleta e muleta; saleta e valeta. Ou, ainda, pedir que as
crianças formem
palavras a partir de letras dispostas de forma desordenada (O C A L, por
exemplo). Nesse caso, o desafio é descobrir a correspondência entre
“sons” e “letras” para obter a grafia das palavras desejadas.
A sugestão sinalizada pelo sombreamento e as letras, no Quadro 2, é que
as capacidades relativas à natureza alfabética do sistema de escrita
comecem a ser introduzidas e trabalhadas no 1º ano da Educação
Fundamental e que sejam tratadas sistematicamente, visando à
consolidação pelas crianças, no ano seguinte.
Dominar as relações entre grafemas e fonemas
Apropriar-se do sistema de escrita depende fundamentalmente de
compreender um de seus princípios básicos: os fonemas são representados
por grafemas na escrita.
Os fonemas são as entidades elementares da estrutura fonológica da
língua, que se manifestam nas unidades sonoras mínimas da fala, como já
se definiu em boxe anterior.
Grafemas são letras ou grupos de letras, entidades visíveis e isoláveis.
Exemplos: a, b, c, são grafemas; qu, rr, ss, ch, lh, nh também são
grafemas. É preciso, então, que o aluno aprenda as regras de
correspondência entre fonemas e grafemas, a partir de um trabalho
sistemático em sala de aula.
Essas regras de correspondência são variadas. Há poucos casos de
relações entre fonemas e grafemas simples e regulares no sistema
alfabético da Língua Portuguesa. Isto significa que nem sempre a relação
entre um fonema e um grafema equivale a uma única correspondência.
São exemplos dessa correspondência rara em que um fonema é representado
por um único grafema, e esse grafema só representa esse único fonema:
fonema /p/ grafema P; fonema /b/ grafema B;
fonema /f/ grafema F; fonema /v/ grafema V.
Mas, mesmo assim, há padrões básicos nos valores atribuídos aos
grafemas, há regras que o professor ou a professora precisa compreender
para saber propor atividades adequadas a seus alunos e para interpretar
com pertinência as dificuldades que eles apresentam.
As relações que predominam são as complexas, que dependem da posição do
fonema-grafema na palavra (são posicionais), ou dos fonemas/grafemas que
vêm antes ou depois (são contextuais).
Uma questão que não pode ser esquecida é o ponto de vista do aprendiz. A
criança que está sendo alfabetizada conhece a fala, não a escrita, e
parte de seu conhecimento da fala para descobrir os segredos da escrita.
As palavras da língua falada são conhecidas, fazem sentido, mesmo
quando decompostas em suas unidades sonoras. Assim, no aprendizado do
sistema de
escrita é importante para o aluno contar com o apoio do significado, em
vez de ser obrigado a lidar exclusivamente com abstrações tais como
fonemas e sílabas.
Prever o significado das palavras a serem reconhecidas na leitura pode
ser uma chave importante na decifração das seqüências de grafemas e no
aprendizado das relações fonemas/ grafemas. Essa proposta corresponde à
natureza da língua, na medida em que considera as dimensões fonológica e
semântica, que funcionam integradamente no sistema lingüístico.
A busca do sentido pode se valer de elementos como o conhecimento do
suporte (livro didático? livro de história? jornal? cartaz?) e do gênero
do texto que está sendo lido (lista de nomes de colegas? lista de
materiais escolares? história? notícia? aviso?). No caso da leitura,
poderão ser criadas situações em que as crianças possam usar elementos
dos textos como pistas
para inferir as palavras que devem ser lidas (sabendo, por exemplo, que o
que estão lendo é uma lista de brinquedos). Paralelamente, no caso da
escrita, é possível prever um conjunto das palavras que podem ser usadas
na produção de determinado texto (por exemplo, um convite de
aniversário, um comunicado da escola aos pais sobre uma reunião na
escola) e, então, discutir e explorar com os alunos as possibilidades de
grafia dessas palavras. Esses são outros exemplos em que se aliam
esforços que vão na direção da alfabetização e do letramento para
favorecer o domínio da língua escrita.
Outro procedimento que pode ser útil nesse sentido é fazer com que os
alunos aprendam “de cor” algumas palavras, quer dizer, promover o
reconhecimento automático de algumas palavras (chamadas de “formas
fixas” ou “palavras estáveis”) e deixar essas palavras visíveis na sala
de aula. As palavras conhecidas, expostas, servirão como apoio e recurso
para as crianças
analisarem e, daí, empregarem corretamente, na leitura e na escrita de outras palavras, as relações fonema-grafema pertinentes.
A leitura e a produção escrita, em princípio, seriam atividades que
exigiriam o domínio do sistema ortográfico de escrita. No entanto, é
possível ler e escrever pequenos textos, com autonomia ou ajuda do
professor ou da professora, mesmo antes de ter domínio do sistema de
escrita.
Por exemplo, na situação de escrever listas úteis de nomes, de objetos
ou de decisões, etiquetas que servirão para organizar a sala de aula,
pequenos avisos, etc., o aluno se vê desafiado a grafar as palavras que
quer empregar e isso provoca a necessidade de refletir e formular
hipóteses sobre como cada fonema e cada sílaba pode ser representado na
escrita. A criança terá
então que se esforçar para distinguir os fonemas que compõem tais
palavras e descobrir possibilidades coerentes de escrever os “sons”
identificados, apoiando-se nos princípios e regularidades que já tiver
apreendido, mas também buscando soluções inéditas.
Considerando a complexidade do sistema, é importante que se leve em
conta, no trabalho de alfabetização, o princípio de progressão do mais
simples ao mais complexo.
O texto de hoje se estendeu até a pagina 34 com reflexão sobre a lingua escrita e sugestões práticas de trabalho.
Relembrar a teoria é sempre importante e sugestões de prática são sempre bem vindas.
PRO LETRAMENTO - Aula 8
Conhecer o alfabeto implica, ainda, que o aluno compreenda que as letras variam na forma gráfica e no valor funcional. As variações gráficas seguem padrões estéticos, mas são também controladas pelo valor funcional que as letras têm. As letras desempenham uma determinada função no sistema, que é a de preencher um determinado lugar na escrita das palavras. Portanto,
é preciso conhecer a categorização das letras, tanto no seu aspecto gráfico, quanto no seu aspecto funcional (quais letras devem ser usadas para escrever determinadas palavras e em que ordem). Apesar das diferentes formas gráficas das letras em nosso alfabeto (maiúsculas, minúsculas, imprensa, cursiva), uma letra permanece a mesma porque exerce a mesma função
no sistema de escrita, ou seja, é sempre usada da maneira exigida pela ortografia das palavras.
Dizendo de outra maneira: mesmo variando graficamente, as letras têm valores funcionais fixados pela história do alfabeto e, principalmente, pela organização das palavras em cada língua.
Uma das implicações do princípio de identidade funcional das letras para o processo de alfabetização é que o aluno precisa aprender que não pode escrever qualquer letra em qualquer posição numa palavra, porque as letras representam fonemas, os quais aparecem em posições determinadas nas palavras.
É bom ressaltar que conhecer o alfabeto representa desenvolver capacidades específicas, conforme se trate de ler ou de escrever. Para ler, é indispensável a capacidade perceptiva que possibilita identificar cada letra, distinguindo umas das outras. Para escrever, além da acuidade perceptiva, é necessária a capacidade motora de saber grafar devidamente cada letra.
Embora a unidade foco do alfabeto seja a letra, podem ser propostas atividades em que as letras sejam situadas em sílabas, em palavras e em textos. Por exemplo, diante de textos lidos – mesmo que pelo professor ou pela professora – os alunos podem se deter no reconhecimento das letras e de sua posição, distribuição e função nas palavras. Do mesmo modo, na tentativa de escrever – mesmo que textos simples como etiquetas, crachás, listas – os alunos poderão operar direta e produtivamente com diferentes tipos e funções das letras. Essa sugestão mostra uma das maneiras de trabalhar simultaneamente um conhecimento específico do domínio do código
escrito com conhecimentos relacionados à inserção no mundo letrado (isto é, conhecimentos que incrementam o grau de letramento do aluno), como o emprego útil da escrita em textos que fazem sentido para as crianças.
(ii) Conhecer e utilizar diferentes tipos de letra (de fôrma e cursiva)
Alguns estudos recomendam o uso exclusivo de letras de fôrma maiúsculas nos primeiros momentos da alfabetização, pelo menos até que o aluno passe a reconhecer todas as letras e tenha destreza na escrita das palavras. Essa orientação apóia-se em alguns pontos. No âmbito da leitura, um argumento é que, por serem unidades separadas (e não contínuas ou “emendadas” como as letras cursivas manuscritas), as maiúsculas de imprensa podem ser
diferenciadas e contadas mais facilmente pelos alunos. Outro argumento é que é mais fácil reconhecer as letras que aparecem em seqüência nas diversas palavras quando essas letras se apresentam com tipos uniformes e regulares, ao invés de mostrarem traços variados (ora maiúsculas, ora minúsculas; ora letra de fôrma ou de imprensa, ora letra cursiva). No âmbito da escrita, o principal argumento é que as letras maiúsculas são mais fáceis de escrever,
especialmente para as crianças pequenas.
Já os defensores do método analítico e/ou global recomendam adotar, no início do processo de alfabetização, a letra de fôrma minúscula e a letra cursiva. A justificativa para essa recomendação é que a memorização do texto, sentença ou palavra, que é a estratégia básica nesse método, apóia-se na imagem ideovisual, ou seja, na silhueta da palavra, e é facilitada pela
configuração gráfica diferenciada das palavras, com letras de traçado ascendente, isto é, para cima, com relação à linha (‘bola”, “tatu”, “farelo”), ou descendente, quer dizer, para baixo, com relação à linha ou pauta (“pipoca”, “gago”, “quase”), ou ascendente e descendente (“galo”, “peteca”, “galope”).
Em sala de aula, essa questão poderá ser encaminhada de maneira
produtiva com flexibilidade e sensibilidade para o aprendizado
específico que estiver em foco a cada momento. Por exemplo, quando
buscar desenvolver a capacidade de leitura autônoma dos alunos, será
mais adequado que o professor ou a professora trabalhe com textos
escritos em letras de fôrma maiúsculas, cuja identificação é mais fácil
para as crianças. No entanto, não é recomendável
que, em nome dessa facilidade, se impeça o contato de seus alunos com
textos e impressos com outros tipos de letras, que circulem socialmente
em diversos suportes, cumprindo diferentes funções.
É também importante que professores e professoras fiquem atentos ao momento mais adequado para apresentarem sistematicamente aos seus alunos as letras minúsculas e as cursivas.
Especificamente quanto às funções da escrita cursiva, é importante o aluno saber que, além de representar estilos individuais de traçar as letras, ela também serve para se escrever com rapidez. Compreendendo os usos da escrita cursiva, os alunos poderão concluir que é possível escrever com a letra que quiserem quando fizerem anotações pessoais, mas que deverão
procurar fazer “letra boa” quando forem escrever para outras pessoas. O desenvolvimento de uma caligrafia legível e com boa apresentação estética, além da organização adequada da escrita nos cadernos, ainda continuam sendo objetivos a serem alcançados pela escola.
Compreender a natureza alfabética do sistema de escrita
Nem todos os sistemas humanos de escrita grafam os “sons” da língua
falada, e entre os que o fazem, nem todos são “alfabéticos”. Há símbolos
da escrita chinesa, por exemplo, que não representam sons, mas idéias,
conceitos. São ideográficos. Na escrita japonesa, há sinais que
representam sílabas.
Nosso sistema de escrita é alfabético. Isso significa que seu princípio
básico é o de que cada “som” é representado por uma “letra” – ou seja,
cada “fonema” por um “grafema”. A história da invenção da escrita e a
existência de diferentes sistemas de escrita mostram que a
correspondência som-letra nem é óbvia e natural, nem é a única possível.
Isso significa, por um lado, que é perfeitamente plausível que algumas
crianças imaginem que a escrita do português seja ideográfica, ou
silábica, por exemplo. E, por outro lado, significa que é necessário
trabalhar essa questão em sala da aula.
Dizendo de outra maneira, um conhecimento fundamental que os alunos
precisam adquirir no seu processo de alfabetização diz respeito à
natureza da relação entre a escrita e a cadeia sonora das palavras que
eles tentam escrever ou ler. Analisando as relações entre a fala e a
escrita,
muitas crianças chegam, por exemplo, a elaborar a hipótese silábica,
acreditando que cada letra representa uma sílaba e não um fonema,
conforme já descreveram os estudos da psicogênese da escrita.
É necessário que o alfabetizador ou a alfabetizadora saiba identificar e
compreender esse tipo de raciocínio feito pelos alunos, para conseguir
orientá-los com sucesso na superação dessa hipótese e na descoberta da
explicação que realmente funciona para o sistema de escrita do
português.
Esse aprendizado, que representa um avanço decisivo no processo de alfabetização, se realiza quando o aluno entende que o princípio geral que regula a escrita é a correspondência “letrasom”, ou, em termos técnicos mais apropriados, grafema-fonema. Isso significa compreender a natureza alfabética do sistema de escrita e se manifesta quando a criança começa a tentar ler e escrever de acordo com o princípio alfabético (uma “letra”, um
“som”).
Por outro lado, é importante também que as práticas pedagógicas levem em conta algumas dificuldades que podem aparecer nos primeiros momentos da
apropriação do sistema alfabético. Nas primeiras tentativas de lidar com as relações entre fonemas e grafemas, alguns alunos poderão tender a
ler, por exemplo, beola, em vez de bola. É possível que esses alunos estejam operando com o seguinte raciocínio: “esta palavra começa com a letra B, que tem o som de [bê], então devo ler be-o-la”. Nesse caso, as crianças estão apenas relacionando o nome da letra ao fonema que ela representa. Pode-se ajudá-las a abandonar essa hipótese equivocada explorando contrastes com
palavras em que o fonema consonantal apareça seguido de diferentes vogais, por exemplo, desafiando-as a ler e escrever bala, bela, bola, bula, ou taco, teco, tico, toco, Tuca, Tuco.
Muitas atividades podem ser (e normalmente são) desenvolvidas em sala de
aula para facilitar aos alunos a indispensável compreensão do princípio
alfabético. Entre elas, aquelas que envolvem a identificação de
determinada relação fonema-grafema em um conjunto de palavras que a
apresentam, como, por exemplo, a identificação do fonema /f/ nas
palavras fita, foto,
futebol, farofa. Outro exemplo é o das atividades que exploram a
contraposição entre palavras parecidas, cuja diferença se deve a um
fonema, representado na escrita por uma letra: cala e cola; janela e
panela; maleta e muleta; saleta e valeta. Ou, ainda, pedir que as
crianças formem
palavras a partir de letras dispostas de forma desordenada (O C A L, por
exemplo). Nesse caso, o desafio é descobrir a correspondência entre
“sons” e “letras” para obter a grafia das palavras desejadas.
A sugestão sinalizada pelo sombreamento e as letras, no Quadro 2, é que
as capacidades relativas à natureza alfabética do sistema de escrita
comecem a ser introduzidas e trabalhadas no 1º ano da Educação
Fundamental e que sejam tratadas sistematicamente, visando à
consolidação pelas crianças, no ano seguinte.
Dominar as relações entre grafemas e fonemas
Apropriar-se do sistema de escrita depende fundamentalmente de
compreender um de seus princípios básicos: os fonemas são representados
por grafemas na escrita.
Os fonemas são as entidades elementares da estrutura fonológica da
língua, que se manifestam nas unidades sonoras mínimas da fala, como já
se definiu em boxe anterior.
Grafemas são letras ou grupos de letras, entidades visíveis e isoláveis.
Exemplos: a, b, c, são grafemas; qu, rr, ss, ch, lh, nh também são
grafemas. É preciso, então, que o aluno aprenda as regras de
correspondência entre fonemas e grafemas, a partir de um trabalho
sistemático em sala de aula.
Essas regras de correspondência são variadas. Há poucos casos de
relações entre fonemas e grafemas simples e regulares no sistema
alfabético da Língua Portuguesa. Isto significa que nem sempre a relação
entre um fonema e um grafema equivale a uma única correspondência.
São exemplos dessa correspondência rara em que um fonema é representado
por um único grafema, e esse grafema só representa esse único fonema:
fonema /p/ grafema P; fonema /b/ grafema B;
fonema /f/ grafema F; fonema /v/ grafema V.
Mas, mesmo assim, há padrões básicos nos valores atribuídos aos
grafemas, há regras que o professor ou a professora precisa compreender
para saber propor atividades adequadas a seus alunos e para interpretar
com pertinência as dificuldades que eles apresentam.
As relações que predominam são as complexas, que dependem da posição do
fonema-grafema na palavra (são posicionais), ou dos fonemas/grafemas que
vêm antes ou depois (são contextuais).
Uma questão que não pode ser esquecida é o ponto de vista do aprendiz. A
criança que está sendo alfabetizada conhece a fala, não a escrita, e
parte de seu conhecimento da fala para descobrir os segredos da escrita.
As palavras da língua falada são conhecidas, fazem sentido, mesmo
quando decompostas em suas unidades sonoras. Assim, no aprendizado do
sistema de
escrita é importante para o aluno contar com o apoio do significado, em
vez de ser obrigado a lidar exclusivamente com abstrações tais como
fonemas e sílabas.
Prever o significado das palavras a serem reconhecidas na leitura pode
ser uma chave importante na decifração das seqüências de grafemas e no
aprendizado das relações fonemas/ grafemas. Essa proposta corresponde à
natureza da língua, na medida em que considera as dimensões fonológica e
semântica, que funcionam integradamente no sistema lingüístico.
A busca do sentido pode se valer de elementos como o conhecimento do
suporte (livro didático? livro de história? jornal? cartaz?) e do gênero
do texto que está sendo lido (lista de nomes de colegas? lista de
materiais escolares? história? notícia? aviso?). No caso da leitura,
poderão ser criadas situações em que as crianças possam usar elementos
dos textos como pistas
para inferir as palavras que devem ser lidas (sabendo, por exemplo, que o
que estão lendo é uma lista de brinquedos). Paralelamente, no caso da
escrita, é possível prever um conjunto das palavras que podem ser usadas
na produção de determinado texto (por exemplo, um convite de
aniversário, um comunicado da escola aos pais sobre uma reunião na
escola) e, então, discutir e explorar com os alunos as possibilidades de
grafia dessas palavras. Esses são outros exemplos em que se aliam
esforços que vão na direção da alfabetização e do letramento para
favorecer o domínio da língua escrita.
Outro procedimento que pode ser útil nesse sentido é fazer com que os
alunos aprendam “de cor” algumas palavras, quer dizer, promover o
reconhecimento automático de algumas palavras (chamadas de “formas
fixas” ou “palavras estáveis”) e deixar essas palavras visíveis na sala
de aula. As palavras conhecidas, expostas, servirão como apoio e recurso
para as crianças
analisarem e, daí, empregarem corretamente, na leitura e na escrita de outras palavras, as relações fonema-grafema pertinentes.
A leitura e a produção escrita, em princípio, seriam atividades que
exigiriam o domínio do sistema ortográfico de escrita. No entanto, é
possível ler e escrever pequenos textos, com autonomia ou ajuda do
professor ou da professora, mesmo antes de ter domínio do sistema de
escrita.
Por exemplo, na situação de escrever listas úteis de nomes, de objetos
ou de decisões, etiquetas que servirão para organizar a sala de aula,
pequenos avisos, etc., o aluno se vê desafiado a grafar as palavras que
quer empregar e isso provoca a necessidade de refletir e formular
hipóteses sobre como cada fonema e cada sílaba pode ser representado na
escrita. A criança terá
então que se esforçar para distinguir os fonemas que compõem tais
palavras e descobrir possibilidades coerentes de escrever os “sons”
identificados, apoiando-se nos princípios e regularidades que já tiver
apreendido, mas também buscando soluções inéditas.
Considerando a complexidade do sistema, é importante que se leve em
conta, no trabalho de alfabetização, o princípio de progressão do mais
simples ao mais complexo.
O texto de hoje se estendeu até a pagina 34 com reflexão sobre a lingua escrita e sugestões práticas de trabalho.
Relembrar a teoria é sempre importante e sugestões de prática são sempre bem vindas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário